
"No exercício da profissão aprendi que a reação individual diante da possibilidade concreta da morte é complexa, contraditória e imprevisível; impossível compartilhá-la em sua plenitude."
(Drauzio Varella em Por um fio, p.8)
Há aqueles que lutam contra ela combatendo sua manifestação primeira, física e mentalmente.
Há aqueles que não impõem resistência à ela, simplesmente aceitam-na e não se empregam em adiá-la (quando é possível).
Há aqueles que já a encontram desde cedo, muitas vezes jovens demais para compreender ou sentir.
Há aqueles que a procuram intencionalmente, ou insanamente.
Há aqueles que não se perturbam, encaram-na como passagem.
Como ela chega até você?
Pode vir como um medo.
Pode vir como um mal, um castigo.
Pode vir como uma provação.
Pode vir como um privilégio.
Pode vir como uma libertação.
Pode vir como alívio.
Pode vir como coragem.
Pode vir como dor.
Dor para aqueles que a tem como uma quase certeza.
Para aqueles que são por ela chamados.
E, para aqueles que vêem e sentem a partida dos levados por ela.
Mesmo quando é previsível, aguardado.
Mesmo quando é tão de repente.
Não importa quanto preparados estamos ou não para sua chegada, machuca, marca, dói.
E quando ela vem mais rápido por decorrência da ir/responsabilidade de outros, e principalmente, daqueles treinados a retardá-la, daqueles que levam o mito de salvarem as pessoas dela e das suas manifestações, o descaso e o desrespeito destes para com as pessoas torna o contato com ela muito mais cruel e doloroso.
Às vezes, ela vem limpa.
Às vezes, ela vem silenciosa.
Às vezes ela ronda, espreita, assusta e se afasta sem concretizar seu feito.
Às vezes, ela vem suja.
Às vezes, ela vem barulhenta.
Às vezes, ela não só ronda e assusta, é impiedosa e cruel.
Não costumamos pensar nela como uma possibilidade presente, mas como um encontro lá longe, distante.
Passar por ela, acompanhando a experiência dos outros, ou por sua própria, afeta em algum nível.
Desconhece-se a hora, o lugar, o dia.
Se chove ou faz sol. Se é carnaval, férias ou natal.
Se é criança, jovem ou idoso.
É da natureza daqueles que respiram. E apegar-se ao seu oposto, ou seja, à vida, "é uma força selecionada impiedosamente pela natureza nos milhares de gerações que nos precederam" (Drauzio Varella,em Por um fio p.11).
Quando as pessoas que tem uma experiência muito próxima dela, é muito comum, quando ainda são plenos de suas faculdades, ressignificarem seu momento. É uma oportunidade de autoconhecimento e conhecimento.
Com sua presença ameaçadora ou concreta, muitos aproximam-se de suas crenças e de seus significativos. Outros, perdem sua crenças, outros que não tinham adquirem-nas e há aqueles que permanecem descrentes...
Ter contato com ela, gera outras percepções da vida, passam a valorizar coisas que no dia-a-dia nunca lhes fora uma figura, apenas um fundo.
Nos fim das contas, ela é inevitável. É natural e repercuti na vida daqueles que por ela são levados e daqueles que acompanham sua partida.
E mesmo indo embora, deixa sua sombra até a readaptação dos enlutados. Depois, é só lembrança.
...
Hoje, completam sete dias em que se foi um ente querido. Como vêem, ainda estou nesse processo. E é curioso, pois mesmo antes dele ir, a morte, sobre a qual escrevo, se apresentou a mim de diversas maneiras e continuou ao longo de todos esses dias. Muitas coincidências. É impossível, não pensar sobre ela, pois realmente, ficou me rondando às vezes mais sutilmente, às vezes mais diretamente e fortemente. Sem dúvida, uma semana mórbida.
Assim, com a morte chega em mim?
Depois de tantas coincidências pra uma semana só, pelo menos nesse aqui-agora, vocês estão sendo cúmplices do resultado do meu ajustamento criativo.
Um comentário:
Obrigado, minha querida. Sempre passo aqui pra ler seus textos. Continue escrevendo! ;) Beijão
Postar um comentário